« Entriangula-te .»
A voz falou ao seu
ouvido, uma vez mais. Suspirou. Subiu ao banquinho de madeira, passou a cabeça
pela argola e olhou à volta uma última vez. A fotografia dele estava na mesa
junto à porta, fitando-a com aqueles olhos que tao bem conhecia, como que
penetrando-a, lendo-lhe os pensamentos. De repente, os seus lábios abriram e
fecharam e a palavra que lhe dissera nesse dia em que a deixou surgiu mais uma
vez : « Entriangula-te ». O corpo contorceu-se uma última vez enquanto saltava
do banco. Viriam a encontrá-lo pouco tempo depois, pendendo do tecto, inerte.
Causa de morte: entriangulamento.
Pobre tonta! Anulou assim a sua existência, sem perceber
que lhe pediam não para se dividir, mas para se multiplicar. Entriangulado é
aquele que consegue
existir em três, que sai
e entra em mundos diferentes – um
perdido em frascos de químicos, outro coberto por frascos de tinta, e
o último de
frascos com mensagens
atirados ao mar.
Misturam-se assim os três numa reacção
química, movimento artístico
ou literário, seja la
o que lhe
quiserem chamar, para se alargarem aos mundos
uns dos outros, seguindo por
caminhos tri-forcados que nunca
pensariam escolher. Esperemos pelo resultado. De qualquer forma , já não
há remédio: entriangulamo-nos uns nos outros.
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